quarta-feira, 20 de junho de 2007

Lágrimas e chuva

Há uma música, de James Blunt, intitulada 'Tears and rain', um lindo tema para reminicências...
Lembro-me da adolescência, quando as lágrimas eram tão leves e a dor, que imaginávamos sentir, nada mais era que um suave canto da alma - nada parecido com as dores que hoje derramamos pelas nossas faces.

Nessa época, minha amiga, Déu, costumava dizer: "Ju, já reparou? Toda vez que você chora, toda vez que você está triste, chove!!!". E num era que acontecia?

Hoje o céu está desabando. Perguntam-me: "você está triste?"...que dizer dessa tristeza calma e serena, que não dói nem fere a carne? Certamente, exultante não estou. Mas há algo que paira sobre a tristeza, algo indecifrável, que me deixa aérea, sonhadora, leve...

E então, ouço a música a me dizer sobre aquilo que gostaria de ter dito, entendido, antes... muito antes: "Como eu desejo que eu pudesse render minha alma; livrar-me das roupas que se tornaram minha pele; vejo o mentiroso que queima dentro de meu precisar. Como desejo que tivesse escolhido escuridão ao frio. Como desejo que tivesse gritado forte. Acho que é tempo de correr para muito, muito longe; encontrar consolo na dor. Todos os prazeres são a mesma coisa: só me mantêm longe dos problemas. Escondem minha forma verdadeira, como Dorian Gray. (...) São mais do que só palavras: são só lágrimas e chuva. Como desejo que pudesse andar pelas portas da minha mente; ter a memória à mão, a ajudar-me a entender os anos. Como desejo que pudesse escolher entre o Céu e o Inferno. Como desejo que eu salvasse minha alma. São mais do que só palavras: são só lágrimas e chuva."
Se o texto tivesse sido escrito por mim, talvez as mesmas referencialidades pudessem ser construídas. O céu e o inferno de Dante, onde me refugio nas tardes de chuva... o retrato de Narciso feito por Oscar Wilde, a busca desesperada pelo conhecimento, e ao mesmo tempo o desejo de fuga incessante...

Continua chovendo, a dor não está, ela é. Mas a convivência tem sido pacífica, sobretudo por que descobri que posso derramá-la não só pelas faces, mas, principalmente, através das palavras, que ouso, confusa e secretamente, despejar sobre o vácuo dessa não-existência virtual.

Ando pelas portas da minha mente, não todas, só algumas delas, e me miro no espelho de Alice, e escolho atravessar os espelhos, derrubar as portas trancadas, e deixar que tudo, absolutamente tudo, possa fluir... como lágrimas e chuva.

terça-feira, 12 de junho de 2007

Princesas


“(...) dizem que as princesas são tão sensíveis que quando estão longe de seu reino podem até adoecer e até podem morrer de tristeza.” – Do filme Princesas, de Fernando León

Eu sabia que mais cedo ou mais tarde ela voltaria, minha companheira de jornada: a tristeza. Não é fácil crescer, ser adulta, ser mulher, ser humana, ser sozinha, demasiadamente humana.
Sinto-me incompreendida, e essa dor da incompreensão dói mais nos inocentes. Todos nascemos inocentes, mas alguns de nós aprendem a lidar, com indiferença, com os olhos marejados de lágrimas daqueles que sofrem por serem, simplesmente, aquilo que são.
Sinto muito por não corresponder às expectativas de quem queremos em nossa vida. E eu tenho que fazer o que tenho que fazer. Mas mesmo assim, me dói quando aquilo que eu tenho que fazer me afasta em demasia daquilo que ardentemente almejo.
Paradoxalmente, sei que não posso negar aquilo que sou! Há pessoas vazias demais nesse mundo, e às vezes simplesmente desejo ser uma delas.
Quem me dera ser daqueles que vivem na inconsciência, que tomam uma cervejinha e ouvem um pagode, se sentindo plenamente satisfeitos com suas vidas.
Quando penso no fluxo da minha vida, sinto-me traído ou enganado, como se tivesse sido vítima de uma piada celestial,como se tivesse esgotado minha vida dançando à melodia errada.” (Quando Nietzsche Chorou)
Essa frase me tocou, ontem à noite quando lia o livro que estou amando. Preciso conhecer Nietzsche melhor, e obviamente aprofundar a minha dor... dor de ser consciente da demasiada condição humana em que nos encontramos.
Percebo-me em busca constante dessa dor, pois a consciência é o processo pelo qual tenho de passar, caminho incessantemente em busca de mais consciência e de mais conhecimento, a minha vida é impulsionada por isso. Essa é a meta que justifica a minha existência.
Contudo, desejo precisamente o inverso, o desejo do esquecimento completo, da ausência absoluta de mim. Mas não há dúvidas, minha natureza me impulsiona a isso: sair da luz da inconsciência e penetrar nas trevas do (auto)conhecimento.
Pra Jung “A tarefa do homem é (...) conscientizar-se. Ele não deve persistir em sua inconsciência, nem tampouco permanecer idêntico aos elementos inconscientes de seu ser, assim se esquivando de seu destino, que é o de criar cada vez mais consciência. Tanto quanto podemos discernir, a finalidade única da existência humana é a de avivar uma chama na escuridão do simples ser.” (s/d: 326)
Veja que para Jung a consciência é a luz, e a inconsciência a escuridão. Mas eu me pergunto, terá ele razão?
No filme Princesas, de Fernando Leon – por sinal imperdível – vê-se o discurso super autoconsciente de uma Caye (Caetana) ao dizer que: “Hoje em dia, não creio muito em Deus, nem sou muito religiosa ou qualquer coisa do tipo. A única coisa em que fico pensando, e creio, é que o pior não seria que não existisse nada após a morte, o pior seria que houvesse outra vida, outra vida igual a esta!”
Assim me sinto hoje. Desejante de que essa vida consciente chegue ao seu termo e eu possa enfim ter a paz dos inocentes.

quarta-feira, 6 de junho de 2007

O silêncio

“Mas, se uma verdade individual é tudo que um livro pode encerrar, resta-me aceitar escrever a minha. O livro de minhas memórias? Não; se a memória é verdadeira, ela assim o é enquanto não for fixada, enquanto não for encerrada numa forma. O livro de meus desejos? Também estes só são verdadeiros quando seu impulso atua independente de minha vontade consciente. A única verdade que posso escrever é a do instante que vivo. Talvez o verdadeiro livro seja este diário no qual tento registrar a imagem da mulher na espreguiçadeira, em diferentes horas do dia, assim como a observo com as várias incidências da luz.””
(Italo Calvino, Se um viajante numa noite de inverno)


Olho o papel em branco e penso o que me impulsiona a escrever. Antes parecia tão fácil, era só começar e as palavras me saiam à maneira de uma inspiração.Aquele tipo de desejo compulsivo que se realizava sem esforço, sem desilusão.
No entanto, tudo parece tão mais difícil agora, e sempre que começo a escrever algumas linhas, nada me consola, nada me satisfaz, é como se eu tivesse perdido algo que nunca tive. Este meu outro eu obscuro que se origina no nada.
E o que tenho para dizer??? No momento, só tenho a minha vontade de escrever sem conseguir.
Há mais coisas que são ditas em silêncio.
Há momentos em que o silêncio é capaz de nos dizer aquilo que a alma cala.
Em silêncio sou capaz de ouvir os sussurros daqueles que me acompanham translucidamente. Vozes ancestrais.
E nada me parece mais belo que o silêncio. Ah, o silêncio!!!! Nos transporta para dimensões outras de nós mesmos. E flutuando ligeiramente sobre a última melodia, sinto-me ir ao reencontro com a beleza de mim.
As visões de lugares nunca visitados me invadem, e desejo, dentro do silêncio, me transportar para além das quatro paredes do meu quarto, evadir desse desejo de permanecer.
O silêncio é meu amante, e esse amor que ora desperta, reelabora identidades, faz nascer ou renascer coisas boas dentro de nós, e não posso me furtar de dizer que, enquanto vivo esse sentimento que me aproxima infinitamente de quem desejo ser, a despeito da distância do que serei, vejo aflorar o melhor de mim.
No momento, o que mais gosto é desse silêncio abençoado em que me encontro, tendo tempo para refletir e, concomitantemente, escrever, operando a catarse de mim, separando-me definitivamente do eu que um dia fui.
Fui....mas já estou vindo... e essa que transborda pelas beiradas da minha alma, que seja bela, que seja leve, que saiba sorrir, sem medo de ouvir o silêncio.

terça-feira, 5 de junho de 2007

Permanecer ilude


A tristeza repentina, que, nos últimos meses, havia se tornado minha habitual companheira, parece ter dado um tempo. Eu sei que não demora muito ela volta. Mas sinto-me mais confiante, acreditando mais na minha materialidade, sem medo do que possa acontecer, seja o bem ou seja o mal – que venga, todo pasará!!!!.

Não quero mais viver em guerra com os meus fantasmas. O passado já passou, e devo me perdoar, e me recompensar com o prazer de viver cada dia. Sei que há tempos não me encontrava, não experimentava sentimentos e sensações. Meu espelho estava vazio de mim. Eu estava vazia de mim. Um oco sem beiras – como diz G. Rosa. Me encontrava na sombra de meus erros.

Mas, hoje, depois desse período de dormência, em que minha alma se calou em demasia, vejo que eu precisava sentir- sentir tudo, até mesmo a dor da consciência de sermos quem somos, tão imperfeitos, tão insatisfatórios.

Precisava me perder, para me encontrar... e nesse encontro, em que me vejo, ainda no silêncio, na penumbra, há algo de indefinidamente belo. Algo que me faz sorrir sozinha, falar com as paredes, e definitivamente cantar!!! Cantar alto, gritar ao mundo: “ei!!! Eu existo, ainda estou por aqui”.

Passar pelas ruas e olhar o mar arredio, enquanto vou ou volto para o trabalho. O mar que me abandona, do qual me divorciei há tempos, mas que amo com loucura!

É preciso estar só para entender que posso me sentir sozinha e não sentir a solidão oprimir o meu peito, posso deitar a cabeça no travesseiro e deixar que me venham os sonhos, indeléveis momentos de prazer. Devo me permitir o prazer. E a vida, essa, apesar de tudo, tem se tornado mais leve.

Não tenho cismado com quase nada. E gosto de aproveitar as horas em que estou trabalhando e aprendendo, e saber que posso fazer muitas coisas sozinha.
E hoje desfruto desse prazer: ser eu mesma! Ainda que essa que sou agora, possa não o ser daqui há pouco!!!

De qualquer forma, não vou perder minha mania de falar a verdade, de querer entender algumas coisas e de desistir de entender outras (existem coisas que não estão aí para serem entendidas).

O que mudou minha vida????

Não sei, mudou, porque nada permanece... “permanecer ilude” – repito Otto.

segunda-feira, 4 de junho de 2007

Quando Nietzsche chorou


Ontem, lendo "Quando Nietzsche chorou", de Irvin D. Yalom, me deparei com um diálogo muito interessante entre dois homens, que apesar de serem casados com mulheres ricas e bonitas, já não têm por elas o desejo primevo, aquele que fornece o impulso inicial para uma relação amorosa...achei interessante o trecho da conversa em que Max diz o seguinte ao Dr. Breuer:


"(...) Alguns dias, quando desço a Kirstenstrasse e vejo vinte, trinta prostitutas enfileiradas, fico bastante tentado. Nenhuma delas é mais bonita do que Rachel, muitas têm gonorréia ou sífilis, mas mesmo assim fico tentado. Se eu tivesse certeza de que ninguém me reconheceria, quem sabe? Eu seria capaz! Todos ficam fartos da mesma refeição. Veja bem, Josef, para cada mulher bonita por aí, existe um pobre coitado que está cansado de fodê-la!"

Pobre coitados!!!! KKKKKKKKKKKK Tadinhos deles...

O que eles não sabem, é que nós também enjoamos... risos!!!!