Lembro-me da adolescência, quando as lágrimas eram tão leves e a dor, que imaginávamos sentir, nada mais era que um suave canto da alma - nada parecido com as dores que hoje derramamos pelas nossas faces.
Nessa época, minha amiga, Déu, costumava dizer: "Ju, já reparou? Toda vez que você chora, toda vez que você está triste, chove!!!". E num era que acontecia?
Hoje o céu está desabando. Perguntam-me: "você está triste?"...que dizer dessa tristeza calma e serena, que não dói nem fere a carne? Certamente, exultante não estou. Mas há algo que paira sobre a tristeza, algo indecifrável, que me deixa aérea, sonhadora, leve...
E então, ouço a música a me dizer sobre aquilo que gostaria de ter dito, entendido, antes... muito antes: "Como eu desejo que eu pudesse render minha alma; livrar-me das roupas que se tornaram minha pele; vejo o mentiroso que queima dentro de meu precisar. Como desejo que tivesse escolhido escuridão ao frio. Como desejo que tivesse gritado forte. Acho que é tempo de correr para muito, muito longe; encontrar consolo na dor. Todos os prazeres são a mesma coisa: só me mantêm longe dos problemas. Escondem minha forma verdadeira, como Dorian Gray. (...) São mais do que só palavras: são só lágrimas e chuva. Como desejo que pudesse andar pelas portas da minha mente; ter a memória à mão, a ajudar-me a entender os anos. Como desejo que pudesse escolher entre o Céu e o Inferno. Como desejo que eu salvasse minha alma. São mais do que só palavras: são só lágrimas e chuva."
Se o texto tivesse sido escrito por mim, talvez as mesmas referencialidades pudessem ser construídas. O céu e o inferno de Dante, onde me refugio nas tardes de chuva... o retrato de Narciso feito por Oscar Wilde, a busca desesperada pelo conhecimento, e ao mesmo tempo o desejo de fuga incessante...
Continua chovendo, a dor não está, ela é. Mas a convivência tem sido pacífica, sobretudo por que descobri que posso derramá-la não só pelas faces, mas, principalmente, através das palavras, que ouso, confusa e secretamente, despejar sobre o vácuo dessa não-existência virtual.
Ando pelas portas da minha mente, não todas, só algumas delas, e me miro no espelho de Alice, e escolho atravessar os espelhos, derrubar as portas trancadas, e deixar que tudo, absolutamente tudo, possa fluir... como lágrimas e chuva.