sábado, 22 de setembro de 2007

Beija as lágrimas de quem chora


Beija as lágrimas de alguém que chora... Em qual fonte de água mais pura hás de beber? Para redimir a sua dor, para transcender a ti mesmo, para descrer e crer em ti de novo? Espera pacientemente e todas as lágrimas de sangue que derramas dentro de ti mesmo, no decorrer do uma vida árida e sofredora, transformar-se-ão num lago plácido e espelhado a céu aberto, em meio a um jardim florido, onde voam colibris de tua alma apaziguada. Sim, beija as lágrimas de quem chora...

Revelações sutis


Quero dormir, tendo alguém que vele o meu sono.

Alguém que se desnude e me cubra com seu corpo.

E, quando for de madrugada, me acorde,

me tome pelas mãos e me mostre as coisas

belas que nasceram enquanto eu dormia.

Tão dentro de mim


No dia em que eu te senti dentro de mim, fez-se minha a tua dor e, desde então, fez-se noite em mim. A tua dor me aprisiona, se desprende de nós e me devora. Anseio o esquecimento das horas más que tens vivido. Quando ouço os teus soluços calados, a ansiedade me rói a alma. Nos suspiros cadentes da tua sinfonia, sustento o olhar que infindamente repousa em ti. Dói-me a tua dor. Suspenso no ar, paira o silêncio que arde, que ecoa retumbante a dizer-nos do medo. Vejo os teus olhos ainda, pressinto o gosto amargo na boca. Vagueia ainda em mim, a trava que tu sentes a sufocar-te o peito. E ainda que eu fuja para um mundo de sonhos, onde as tuas quimeras se desfazem, ao entardecer, saberei sentir ainda o sabor da tua lágrima. Queria inventar-te um amanhã povoado de estrelas, fazer-te sentir a liberdade de ser o que tu quiseres, retirar de ti esta ânsia que nada acalma. Quem me dera pudesse eu ter asas que a ti pudesse doar, fazer-te deixar de ser chão, sem receios para voar. Contudo, não me atrevo a inventar o sonho, me sinto ínfima, pequena. Conheço os teus pecados, pois eles também são meus. Pronuncio as tuas blasfêmias, elas também vêm de mim. Pois é mesmo assim, desde aquele dia, tu andas tão dentro de mim.

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Apenas o caos


Sinto que o espelho novamente deseja fragmentar-se e romper-me. Já excedem os restos de mim e sobram angústias e ansiedades, que mesmo latentes, se fazem demasiadas. Não é fácil SER. Não é fácil ver-se através desse espelho que se estilhaça continuamente. É preciso serenar a minha angústia, mas não! Eu não me dou sossego, eu não me deixo em paz.
Quero dizer o indivisível e resolver o impensável, quero pensar o impossível e viver o indispensável. E embora o desejo haja, o impulso de vida, que não me alimenta e diariamente me devora, faz em mim, essa inquietude desavisada, essa mansidão rebelada, essa falta de tudo que em mim cala.
E então, no espelho que se quebra, vejo as roupas rasgadas, o cabelo embraçado, os olhos borrados, a boca partida. E para além dessa imagem não há mais nada, em tudo o que sou, sobeja, apenas, o caos.

terça-feira, 11 de setembro de 2007


Sinto que já disse tudo o que poderia dizer, sinto-me esgotada de palavras, tão vãs, tão ineficazes. O silêncio é o meu caminho. E esse destino que me cabe, é ter de Deus o sofrimento.

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Fatal


Anda muito difícil escrever, por isso, venho me desculpar, se tenho apego às palavras alheias que por vezes são aqui pronunciadas, para dizer o que a incapacidade humana supunha poder criar, sem jamais consegui-lo. E, embora esteja mesmo muito difícil, escrevo para amansar meus fantasmas, expurgar os meus demônios, destilar o meu veneno e despir a minha pele. E, o que mais dolore, nesta hora, é o não poder escrever dignamente a minha dor. A maior tortura daquele que escreve é jamais poder alcançar a beleza suprema de uma lágrima que escorre na face dos piedosos. E, então, suplicante, rogo aos deuses que me torne piedosa, para quem sabe poder descobrir o mistério dessa lágrima, e, decisivamente, através das palavras, fazê-la escorrer sucessiva e infinitamente. É penoso escrever agora. Na verdade, sempre o é. Contudo, insisto, pois, ao escrever, é quando mais vivo. Na escrita tudo é permitido, o impossível não existe. Quando se escreve as palavras mais tristes de uma língua: "poderia ter sido", mente-se. Tudo pode SER. E sendo, será continuamente. E se, nessa-vida-aquém-e-além-das-palavras, muito pouco nos é permitido, para aquele que escreve, o metafórico, o metafísico e o sobrenatural se fazem amantes perpétuos. E se o que escrevo carece de dignidade, não culpem as palavras, puna a quem as ousa violentar. E ainda que me punam, contunuarei a ousar fazê-lo. Desistir seria simplesmente fatal, fatal, fatal...

Tudo retorna sem cessar. Se o universo tivesse algum objetivo, já o teria atingido; se tivesse alguma finalidade, já a teria realizado: Não existe um Deus, soberano absoluto, com desígnios insondáveis. Todos os dados são conhecidos; finitos são os elementos que constituem o universo,finito é o número de combinações entre eles; só o tempo é eterno. Tudo já existiu e tudo tornará a existir.


NIETZSCHE

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

“Nosso sonho se perdeu no fio da vida, e eu vou embora,
sem mais feridas, sem despedidas,
eu quero ver o mar”




Em tempos modernos, sonhar com príncipe encantado já anda fora de moda. Mas eu, descompassada que sou com o meu tempo, continuo sonhando com o amor cortês da idade média. Mas me pergunto, porque morreu o amor cortês? Um amor ao mesmo tempo ilícito e moralmente elevado, passional e auto-disciplinado, humilhante e exaltante, humano e transcendente entre o desejo erótico e a realização espiritual. Um amor capaz de gerar uma devoção contida, e, ao mesmo tempo, pulsante, criativa, como o provam as Cantigas de Amor do cancioneiro medieval. O homem contemporâneo perdeu a capacidade criativa do amor cortês. E eu com isso??? Eu: sou Dulcineia desvairada, a perguntar pelas ruas: “onde andará meu Dom Quixote?”. Sou Isolda, enfurecida, a amaldiçoar o mar, que insiste em levar e nunca mais devolver o Tristão que nunca me chegou.